segunda-feira, 22 de maio de 2023

PALMEIRINHAS FUTEBOL CLUBE

Nos meus tempos de escola sempre gostei muito de estudar no período da manhã, pois o sol é mais fresquinho, e já no intervalo ou recreio como era chamado na época, aqueles trinta minutos regulamentares que deveriam ser destinados a uma rápida alimentação e descanso entre as aulas, ao contrário disso o nosso lance era comer a bola.
Após refeição rapidinha da santa merenda que a escola nos oferecia, nós não perdíamos tempo, e logo a gente improvisava uma bola de qualquer coisa que desse, papel, meia, tampinha de garrafa ou qualquer outro objeto que pudesse ser chutado, cujas traves eram feitas por chinelos, sapatos ou qualquer outra coisa perdida pela escola. Qualquer lugar da escola que tivesse um espacinho razoável para a gente correr. seria o nosso campo, e no Anísio Carneiro das antigas, esse tipo de espaço era que mais tinha.
Na maioria das vezes essas artes nos rendiam alguns minutos na diretoria da escola. que além do longo sermão da inspetora chefe, ainda existia o famoso puxão de orelhas, que para nós, apesar de doer um pouco, era uma espécie de troféu, pois coroava toda nossa fama de "espirito de porco" perante ao resto dos alunos.

Depois das aulas, bem de tardezinha, a molecada do bairro onde morávamos se reuniam para formarem o tradicional treino "saidera'. Depois de um tempo reunidos, soltavam a lista com a escalação para o "pega" da tarde. Estar entre os primeiros escolhidos da lista era sinal de estávamos entre os melhores do pedaço, que éramos "bom de bola", e isso inflava nossos egos e criava a expectativa de alcançar um dia o tão sonhado profissionalismo.
Aos poucos esse sonho era incrementado pelas diversas "peneiras" que aconteciam pela cidade, onde os clubes escolhiam a molecada para fazerem parte de seus elencos. As categoria eram chamadas de "Dentinho", “Dente de Leite”, e "Dentão", o que nos dias de hoje correspondem aos sub-10, sub-14 e sub-16.

Foi por ai que começou meu caminhar pelo times menores da cidade, pois numa dessas peneiras, o então técnico do Palmeirinhas, professor Luizinho Sapateiro fez o convite para que eu fosse fazer um teste no time dele.
Á principio fiquei meio na dúvida, pois eu corintiano roxo desde a gema, jogar pelo Palmeiras? Mas o sonho de ser um jogador profissional falou mais alto, abri uma exceção e fui.
Não foi muito difícil de conquistar uma vaga no time do Luizinho, porém o balde de água fria veio quando de cara ele disse que eu jogaria de zagueiro central.  Zagueiro central, logo eu que adoro fazer gols, mas como sonhava com coisas maiores, e era pegar ou largar, aceitei de boa. 
Depois de muito treinar, finalmente iria começar o campeonato da categoria dentinho. 

Quase perto das oito horas da manhã de um domingo, caia um fina garoa, quando o portão do campo do campo do Almoxarifado da Cecap se abriu para um bando de moleques ansiosos, que carregavam a tiracolo suas sacolinhas das mais variadas estampas, e que acomodavam carinhosamente suas chuteiras, entrarem.
O vestiário era mal iluminado e com bancos de madeira alinhados às paredes, apesar do ambiente escuro, os olhos da garotada brilhavam com a oportunidade de pisar pela primeira vez em um campo oficial. Para mim que sempre joguei na rua ou nos campinhos todos cheios de buracos, aquilo era a glória.

Na hora de entrar em campo então foi o apogeu, fique tão feliz que nem senti os efeitos da terrível goleada que nosso time levou. O campeonato prosseguiu por várias semanas, porém o nosso time por mais aplicado que fosse, não conseguia fazer frente aos bons times da época. Dentre os bons times da época cito o Brasinha do Machado, o São Paulinho do Miguel, e a temida Escolinha do Professor Jairo, times esses que dominavam os campeonatos menores de Tupã nesse tempo.
Nos anos seguintes ainda joguei pelo Palmeirinhas, que com apoio de algumas empresas, conseguiu montar times melhores e mais estruturados. Mais tarde passei por outros times da cidade, até cair a ficha de que não dava mais para ser o tão sonhado jogador profissional. A partir de então decidi que não disputaria mais jogos valendo por campeonatos, apenas bateria minha bolinha sem compromisso.

Texto:
Paulo Cesar - PC

segunda-feira, 1 de maio de 2023

QUE LUZ É ESSA?

Lá pelos idos de 1984, na década batizada como "A charrete que perdeu o condutor", pelo maluco beleza Raul Seixas, eu tinha uns primos que moravam em uma grande fazenda ali pelos lados do Bairro Itaúna, no vizinho município de Iacri/SP.
Nessa importante fazenda havia diversos segmentos agropecuários, que exigiam muita mão de obra, e por causa dessa demanda existiam muitas residências em aglomerados pela fazenda, e que recebiam o charmoso nome de colônias. Meus primos moravam em uma dessas colônias, numa das casas que fora cedido à família pelo dono da fazenda na assinatura do contrato.
A família dos primos trabalhava no setor do café, mas além do carro chefe, que era o café, ainda tinha o plantio de amendoim, milho, a pecuária leiteira, entre outras cultivos.
De todos os cultivos dessa grande fazenda, destaco uma icônica plantação de eucaliptos, pois formava uma verdadeira cerca viva em torno da entrada da fazenda, um grande e misterioso cinturão verde que chegava a botar medo pela sua dimensão, e que é o tema principal dessa divertida resenha.

Na fazenda tinha um time de futebol formado em sua maioria pelos seus trabalhadores, alguns amigos, e parentes que iam aos domingos na fazenda passear, e eu enquadrava num desses casos. O time era meia boca, pois a cada domingo era uma formação diferente, mas dava para se divertir, competir, nem tanto.
Como não podia deixar de ser, pelo menos uma vez por mês eram realizados pequenos bailinhos nas residências dos colonos, pequenos arrasta-pés domésticos, onde os participantes eram geralmente o pessoal do lugar e mais alguns convidados. Na maioria das vezes, como ainda era difícil de se ir a outros eventos, pelo acesso ser difícil, os namoros e casamentos aconteciam entre eles por ali mesmo, ou às vezes com alguns visitantes. Só para constar, eu não perdia um bailinho, pois unia o útil ao agradável, arrastava o pé à noite, e na tarde do domingo batia minha bolinha.
Jogava no aspirante mesmo, pois além de não ter cobrança por resultados, o jogo acabava mais cedo e dava tempo de pegar o ônibus de volta para Tupã. Outro motivo também era de que o caminho que fazia na volta teria de passar no meio dos eucaliptos, e que dava um medo danado quando estava escurecendo.

Existia uma lenda rural, em que os antigos moradores da fazenda diziam, em algumas noites aparecia uma estranha luz no meio dos eucaliptos. Essa suposta luz quando aparecia, segundo eles, cortava de fora a fora a plantação.  Eu para evitar tal encontro com essa misteriosa luz, jogava no time B da fazenda, o chamado Cascudão, e seguia a vida feliz, e sem contratempos..
O tempo foi passando e eu sempre fazendo o mesmo expediente, sempre resistindo aos pedidos do técnico do time para jogar no time principal, mas nunca revelando o real motivo pela recusa. Como tudo nessa vida é cíclico, enjoei dos bailinhos e com isso deixei de jogar pelo time de meus primos. Acabei não fazendo mais aquela via sacra mensal, como isso a história da estranha luz, que nunca tinha visto, mas que acreditava piamente devido aos relatos dos moradores, principalmente de meu tio Caetano, um baiano cujo os acertos com ele eram feitos no fio do bigode, acabou caindo no esquecimento.

Alguns anos depois iria acontecer uma grande programação na fazenda, e dentre elas uma seria um torneio de futebol no domingo. Como nunca fui de negar um convite para bater uma bolinha, meus primos acabaram me convencendo a participar, Atrelado aos festejos iria ter um bailão na véspera, então lá fui eu unir o útil ao agradável novamente. Nesse tempo eu já não andava mais a pé, a vida tinha melhorado um pouquinho, e já tinha na minha companhia uma genuína HONDA CG 125, ano 1978, cor vermelha, top de linha.
Como já não tinha mais preocupação com busão, pois estava motorizado e nem com a luz, afinal já era adulto, então não caia bem ficar com esse medinho de molequinho mimado pela vó. Isso posto, joguei no time principal e fomos ganhando as partidas, até ficarmos para grande final, porém perdemos nos pênaltis, com a noite já caindo sobre a fazenda.

Quando estava saindo da fazenda, passando pela estrada de terra, no meio dos eucaliptos, minha querida "cegezinha" afogou por causa de um banco de areia. A moto CG era quase perfeita, só tinha um pequeno negocinho chamado platinado, que às vezes dava um trabalho danado, e nas horas mais improváveis.
Quase calmamente desci da moto e comecei a dar partida, mas a danada não queria pegar de jeito nenhum, quando isso acontece a gente logo pensa em 'dar um tranco". Porém para que pudesse realizar tal procedimento, teria que achar uma pequena descida, para embalar a moto.
Tive que empurrar um tanto bom, e no meio desse tanto bom vieram à tona todas as estórias dos moradores à cabeça. Nesse instante deixei de ser aquele adulto machão e voltei a ser o molequinho mimado pela avó Maria Madalena, e o medo voltou a me habitar com força total, que qualquer barulhinho que fizesse no meio do mato já era suficiente para o meu coração disparar, e começar a imaginar coisas terríveis. 
Mas ainda bem que logo chegou a tal descida, acabei dando o tranco, e fui embora. Graças a Deus a tal luz estranha não deu as caras naquele dia, e o encontro fora adiado mais uma vez.

Meses atrás, dando os meus rotineiros passeios de motocicleta, passei pela estrada que dá acesso a fazenda, hoje uma vicinal muito bem construída. Na ocasião pude observar que ainda existe a plantação de eucaliptos, porém em bem menor quantidade e sem aquele glamour da época, com isso acredito que provavelmente a luz também não apareça mais, deva ter isso embora procurar um novo espaço. Melhor, assim nosso hipotético encontro não terá mais possibilidades de acontecer um dia.
Infelizmente a colônia de moradores nem existe mais, só restaram as casas já bem deterioradas pela ação do tempo, e onde era o campo de futebol, ao invés de jogadores e toda aquela agitação, hoje temos um belo rebanho de bovinos pastando tranquilamente. De recordação, apenas as traves, do belo campo de futebol de outrora, enferrujadas pela ação do tempo, uma pena!

Texto:
Paulinho - PC