quinta-feira, 21 de outubro de 2021

O MALVADO

Naqueles tempos em que uma bola de futebol de capotão surrada ou qualquer coisa esférica que lembrasse uma bola comandava nossas vidas e fazíamos de qualquer lugarzinho ligeiramente plano um campinho de futebol, inúmeras histórias interessantes apareceram nesses encontros futebolísticos inusitados.
Dentre essas histórias, hoje vou destacar uma em que no meu ponto de vista, além de uma grande sacanagem com os amigos, foi também maldade pura de minha parte, coração espinhudo mesmo, devia estar possuído naquele dia, não tem outra explicação.
Anteriormente havíamos feito um jogo amistoso contra os moleques do outro lado do bairro Afonso 13, o povo do Aeroporto, como eram conhecidos. Vale lembrar que o bairro Afonso 13 tem dois lados distintos, essa divisão é feita pelo histórico Córrego Afonso 13.
Com isso tínhamos dois times de molecada, o do lado de cá do buracão, o nosso, ou seja o que margeava o saudoso Frigorifico Sastre e também a Escolinha Rural, e o do lado de lá, que tinha o Aeroporto Municipal Faria Lima como referência. Para quem mora aqui na região de Tupã vai se localizar rapidinho.

De acordo com a tradição da época, tínhamos que pagar a visita dos boleiros vizinhos, disputando um jogo amistoso no campo deles.
Beleza então, marcada a data nos reunimos e fomos, cada um em sua Monareta, uma espécie de bicicleta barra forte da época. Os boleiros que não tinha byke foram de carona no cano, vida dura. Chegando lá fomos recebidos por um senhor já bem de idade, que veio abrir a porteira para que a gente pudesse adentrar à fazenda, onde seria realizado o tão esperado jogo de volta.
Lembro-me que o idoso nos disse com cara de intimidação:
- " Tomem cuidado, pois os meninos disseram que hoje vão ganhar de vocês, nem que seja na porrada, se for preciso". Eles haviam perdido para nós no jogo de ida, e ainda, para variar tinha ocorrido alguns bate bocas, coisas normais de um jogo quente. Em tempo, o valentão do nosso time que tinha brigado com os caras nem deu as caras para o jogo de volta, amarelou.

Chegamos ao local do jogo, e ao contrário do que o velhote disse, encontramos um pessoal bem receptivo, sem mágoas aparente e com fome de bola apenas.
Acredito que esse clima de cordialidade rolou somente porque eles notaram que o valentão não tinha ido, caso contrário tenho minhas dúvidas. O capitão do time deles nos indicou o lugar para que a gente pudesse nos trocar, no caso colocar nossas camisetas para entrar em campo.
O lugar era debaixo de um grande pé de manga, uma espécie de vestiário a céu aberto, porém bem confortável. Só uma nota sobre nosso uniforme, eram camisetas brancas, compradas nas diversas malharias populares que existiam na cidade na época, e tingidas carinhosamente com corante vermelho, pela minha saudosa vó Maria. Outro detalhe, o nome do time apesar do uniforme ser vermelho era Canarinho, coisas do futebol raiz.

Assim que fomos chegando perto do local em que íamos nos trocar, avistei uma enorme caixa de abelhas, não me preocupei, pois pensei comigo, se ninguém mexer com elas, elas continuarão a vida delas como se nada tivesse acontecido. Mas também imaginei, se alguém acertar bolada não vai prestar.
Eu sempre fui o mais fominha para jogar bola, por isso me troquei rapidinho e fui para o campo bater bola. Dei alguns chutes na bola e reparei que os malas estavam meio sem pressa para vir para ao campo.
Nesse dia fazia bastante calor, então eles estavam fazendo cera, esperando o mormaço dar uma trégua.
Pistola da vida com a fuleragem dos caras, pois estava no campo naquele calorão sozinho, não me conformei e fui lá agilizar a coisa, mas de nada adiantou. Voltando ao campo mais pistola ainda com a negativa dos caras, avistei uma pedra e não pensei duas vezes, peguei a danada e arremessei na caixa de abelhas.
Acertei em cheio, aquilo em fração de segundos ficou tudo fumaçado de abelhas, de onde você nem imaginava aparecida as ofendidas em busca de vingança. Não ficou um folgado debaixo do pé de mangas para contar a história.

Juro para vocês, apesar de ter levado algumas picadas também, por um momento me senti de alma lavada, uma lição naquele bando de folgados, pensava assim comigo. Coisa de moleque malvado mesmo, que aparentemente tinha tido um surto momentâneo.
Por sorte deles e mais minha ainda, nenhum infeliz tinha alergia à picada de abelha, e não houve nada sério, somente muita reclamação e juras de vingança, que no fim não virou em nada.
Apesar de doloridos, os caras levaram a brincadeira na boa, pois já tinha acontecido outras armadas piores no grupo anteriormente, e já estavam todos vacinados contra aquele tipo de zueira, e também naquele tempo o mimimi ainda não existia, então acabou ficando tudo certo.
Com respeito ao jogo, não houve nenhum contra tempo mais relevante, apenas as discussões de rotina e alguns empurrãozinhos, tudo dentro da normalidade de uma partida de futebol.
O resultado final acabou sendo o empate sem gols, e para terminar ainda fomos presenteados com sacolas de mangas, que a dona da fazenda, a mãe de um dos meninos nos presenteou no final.

Texto:
Paulo Cesar - PC

quarta-feira, 13 de outubro de 2021

NECROPOLITANO FUTEBOL CLUBE, ESSE TIME É DE MORTE!

O futebol de várzea sempre foi, ao lado do samba, o canal principal de divertimento do povo que habita os subúrbios carioca. No auge do futebol de várzea fluminense, lá nos anos 70, todo bairro tinha um, dois, até três times "oficiais" para chamar de seu.
Além dos times tradicionais que eram formados na comunidade, também era comum as empresas desses bairros terem seus times de futebol de várzea, formados na maioria das vezes pelos seus próprios funcionários, os chamados puro sangue. Com tantos times brotando por todas as partes, por que então os cemitérios suburbanos não poderiam ter um também? Daí que surge o Necropolitano Futebol Clube do bairro do Irajá, que era um time formado exclusivamente por funcionários do cemitério do Irajá. O time da morte, como era conhecido, no qual os coveiros eram maioria no elenco. 

O time foi fundado em 1972 e conseguiu alcançar um relativo sucesso dentro da liga amadora carioca, não apenas pelo bom futebol apresentado em campo, mas também pelo inusitado local de preparação dos jogadores, que era feito no meio das covas.                                               

                                            MANCHETE ESPORTIVA DO ANO DE 1977


História bem peculiar à várzea carioca daquele tempo e a do Necropolitano, nos remete aos movimentados torneios dos trabalhadores, que são realizados no dia primeiro de maio aqui em Tupã, cujos times são formados, na maioria por funcionários de empresas ou segmento profissional, que acabam proporcionando disputas acirradas.
Sinceramente não me recordo se durante as edições anteriores tivemos alguma equipe que representou os cemitérios locais, porém muitas categorias de trabalhadores formaram equipes ,boas ou nem tanto, dentro das respectivas profissões.
Dentre essas profissões que tiveram destaques, e que consigo me lembrar, cito o pessoal das farmácias, cujo treinador era o saudoso professor "Toninho Farmacêutico", que tinha uma elegância peculiar na beirada de campo, porém o time nunca chegava, geralmente caia na primeira rodada, era mais para participar apenas. Também o time do antigo Frigorifico Sastre, esse sim era time de chegada, estava todo ano beliscando os primeiros lugares.

Esse tipo de torneio é muito legal de se ver jogar, nem sempre belo futebol apresentado, mas sim pelo companheirismo que se vê entre os caras dentro do campo.
Nos torneios dos trabalhadores das antigas eu gostava muito de acompanhar o time do Mercadão, que era formado na sua grande maioria pelos açougueiros que trabalhavam nas inúmeras casas de carne que existiam no saudoso Mercadão Municipal. O Mercadão tinha no seu elenco, o grande zagueiro Zé Carlos Açougueiro, irmão do Britinho, atleta profissional que brilhou no cenário futebolístico nacional nos anos oitenta.

Texto:
Paulo Cesar - PC